terça-feira, 25 de agosto de 2009

Sobe devagar, Maria Fumaça!


Como já relatei em post anterior viajei por três anos todos os dias no trem que subia a serra de Trabiju a Dourado-SP, no início dos anos 60. Era a única maneira que cursar o segundo grau.

Optei pela Escola Normal, pois ao contrário do Científico e Clássico,(assim se chamavam os três anos do colégio na época) oferecia profissionalização imediata. Essa escolha ligou-me para o resto da vida à coisas da educação. Tornei-me professor primário e depois fui para a Faculdade estudar Pedagogia e passei a trabalhar como professor e posteriormente me envolvi com educação profissional. Mas isso é outra história.

Feito esse longo parêntesis, voltemos ao que queria contar, sobre minhas fumegantes viagens de trem.

Como eu disse o trem em que eu viajava subia a serra puxado por uma locomotiva a vapor, que usava toda sua potência para subir um pequeno trecho de serra. Nos trechos mais íngremes, resfolegava soltanto rolos espessos de fumaça e consumindo muita lenha. Além disso consumia areia.

Areia? podem perguntar aqueles que não conhecem essas locomotivas. Sim areia, através de um dispositivo que joga a areia nos trilhos sob as rodas de ferro para evitar que o trem patine nos trechos em que os trem percorre inclinações.

Mas o mais divertido para nós adolescentes, era que o trem subia a serra muito devagar.

Tão devagar que descíamos do trem e o acompanhávamos a pé por longos trechos. Quando ele começava a pegar velocidade de novo subíamos todos de volta e continuávamos tranquilamente nossas viagens, felizes, enquanto nossa respiração voltava ao normal após o esforço da caminhada ao lado do trem!

sexta-feira, 14 de agosto de 2009

Olha o trem, acerte o relógio!


Quando velhos ferroviários contam que acertavam seus relógios pelo trem, muita gente pensa que estão inventando histórias e criando lendas sobre a pontualidade dos trens que hoje soa mesmo como "causos" criados pela imaginação popular.

Posso garantir a vocês que é a mais pura verdade. Houve tempo em que acértavamos os relógios pelo apito do trem quando partia da estação, passava por perto de nossa casa ou ouvíamos seu apito e pelo período do dia sabíamos qual era a hora certa.

Por muitos anos morei em casa da ferrovia quando menino e adolescente. E a nossa casa ficava ao lado dos trilhos do trem onde a Maria Fumaça passava algumas vezes por dia puxando um comboio de passageiros ou de vagões de carga.

E era bem perto da estação. Então, na minha casa todo santo dia, acontecia a mesma coisa quando o trem apitava na estação ou quando passava em frente à minha casa: quem estava na sala onde ficava o velho relógio de parede olhava automaticamente para ele para ver as horas que estava marcando. Se estivesse certo, de acordo com o apito ou barulho do trem, tudo bem. Se não, quem lá estivesse tinha a obrigação de subir na cadeira e acertar o relógio.

Muitas vezes, quando meu pai ferroviário estava em casa e na sala e eu também, ouvia seu chamado:
- Menino acerte o relógio! E lá ia eu, célere, subia na cadeira e acertava o velho relógio!

segunda-feira, 3 de agosto de 2009

Ferroviários em greve

Sabem aquela fotografia famosa que os soldados americanos levantaram ao final da batalha contra os japoneses na ilha de Iwo Jima? Pois é.

Quando vi a foto pela primeira vez fui lançado à minhas lembranças de infância.

Explico: a primeira vez que vi uma cena parecida foi quando tinha 13 ou 15 anos, na década de 60 em uma greve de ferroviários.

Quando era declarada a greve um dos meios utilizados pelo grevistas para impedir que os trens saíssem da estação era se amontoarem sobre os trilhos e esperar que o trem viesse, pois sempre haviam os chamados fura-greves que dirigiam as locomotivas e obedeciam às ordens dos patrões.
Numa dessas vezes, um pequeno grupo de ferroviários teve a idéia de pegar a grande bandeira brasileira que normalmente era hasteada na estação e levar para o meio dos trilhos.

A grande bandeira segurada por vários ferroviários em greve tremulava ao vento sustentada por uma aglomeração de ferroviários e lá veio a locomotiva fumegando como se fosse atropelar todo mundo.

Foram momentos de tensão até a locomotiva parasse provocando uma salva de palmas e gritos de satisfação e alívio de todos. A cena então se delineou: os ferroviários segurando a enorme bandeira tremulante com a locomotiva fumaceando ao fundo!

Ah...quanta falta fez uma máquina fotográfica naquela hora. Imaginem hoje em dia: com certeza a cena seria fotografada. Com câmaras digitais ou celulares!

sábado, 1 de agosto de 2009

Os ferroviários e as lendas urbanas

LOBISOMEM NOS TRILHOS

Toda noite de lua cheia é a mesma coisa há quase um século. Começou quando ainda não havia energia elétrica na estação.Os ferroviários já sabiam o que fazer quando chegava a lua cheia.

Como na maioria das vezes ficava só um trabalhador no local, ele enchia o pátio da estação de cruzes de madeira, feito com o material retirado das cercas para espantar um lobisomem que teimava em aparecer por lá.

Quando os trens passavam, passageiros e tripulantes ficavam apavorados, pois o local parecia mal assombrado. Insistente, o lobisomem tentou entrar em casa de um dos ferroviários, no Km 17 da Noroeste, que acordou com o barulho do animal arranhando a porta.

Como não tinha arma, ele arremessou um cruxifixo na direção do bicho, que tropeçou e caiu em uma hortinha que ficava na frente da casa do trabalhador.

O lobisomem teria fugido e nunca mais voltado àquela casa. Mas ele ficou para sempre na memória daquele ferroviário. Afinal, as pimentas que estavam plantadas na horta ficaram doces como mel, em razão do bicho ter tocado nelas.

História publicada, incluindo a ilustração, no encarte Viva Bauru 113 anos, do Jornal da Cidade de Bauru e Região de 01 de agosto de 2009