quarta-feira, 30 de setembro de 2009

O trem no Brasil...e na minha memória.

por Eduardo Chaves
2 de Agosto de 2006

O trem no Brasil

Fazia tempo que vinha procurando sites sobre a história
do trem no Brasil. O trem foi muito importante na minha
vida. Com um mês e doze dias fiz minha primeira viagem
de trem.

Nasci em 7/9/1943, em Lucélia, na chamada Alta Paulista.
Meu pai escreveu um pequeno relato de meus primeiros
dois anos. Eis o que ele diz sobre essa primeira viagem de
trem, nos dias 19-20/10/1943:

"No dia 19 de outubro tomamos a jardineira até Tupã.
O dia estava quente, mas o Oscarzinho dormiu quase o
tempo todo. Só chorava quando a jardineira parava.
Às 2 hs. da tarde chegamos a Tupã e às 3,45 tomamos
o trem.

A viagem não foi muito boa, pois o trem estava muito cheio!

Metade da viagem foi feita no carro de 2ª classe,
pois não pudemos
arranjar lugar na 1ª classe, devido ao
grande número de pessoas.

Passamos a noite com o Nenê nos braços. Ele não deu
trabalho,
pois dormiu mais ou menos bem. Às 6 hs. da
manhã chegamos
a Campinas."

Como se vê, em Outubro de 1943 a linha da Paulista parece
que chegava apenas até Tupã - não indo até Oswaldo Cruz,
Lucélia, Adamantina, Dracena.

Esta foi a primeira de muitas viagens de trem do local de
residência dos meus pais até Campinas, onde moravam minha
avó materna e minha tia, irmã de minha mãe (que faleceu faz
um mês, aos 85 anos - minha mãe faz 82 agora segunda-feira).

Meus pais se mudaram de Lucélia para Irati, no Sul do Paraná,
depois para Marialva, no Norte do Paraná, depois ainda para
Maringá, também no Norte do Paraná, e, finalmente, para Santo
André, em São Paulo, onde minha mãe e meus irmãos ainda
residem (meu pai faleceu em 1991). Viajávamos sempre de trem.

As viagens que ficam mais gravadas em minha memória eram
entre São Paulo (Estação Sorocabana) e Ourinhos, no famoso
(e confiável) Expresso Ouro Verde. Saía da Sorocabana em São
Paulo por volta das 22h (22h10, creio) e chegava a Ourinhos de
manhã. O trem era lindo -- verde, naturalmente.

Íamos numa cabine leito, meus pais, meu irmão
(mais novo 3 anos e 3 meses) e eu. Eu dormia no beliche de
cima, com meu pai, meu irmão no beliche de baixo, com minha
mãe.

Isso se dava antes de eu completar sete anos. Minha mãe
levava sanduíches de presunto e queijo e um sacolinha com
queijo e goiabada. Viagem de trem para mim ficou para sempre
associada com sanduíches de presunto e queijo e com
Romeus-e-Julietas...

Quando mudamos para Santo André, o trajeto mudou.
Pegávamos o trem subúrbio até São Paulo e lá pegávamos
o trem da Estrada de Ferro Santos-Jundiaí para o interior.

Em Jundiaí a locomotiva (vermelho meio escuro) era removida e
uma locomotiva da Companhia Paulista de Estradas de Ferro
assumia - linda, linda, azul... - e o trem passava a ser conduzido
por empregados da Paulista.

Em Jundiaí o trem parava uns 15 minutos e a plataforma da
estação ficava cheia de vendedores ambulantes vendendo,
entre outras coisas, "pipóóóóóóóóóóóca". Vendiam uva e figo
também: Jundiaí é terra de uva e figo.

Campinas era um importante entrocamento ferroviário.
Além dos trilhos da Companhia Paulista passarem pela cidade,
começava ali também a linha da Companhia Mogiana, e havia
um ramal, o da Companhia Ituana, que ligava Campinas
diretamente à Estrada de Ferro Sorocabana, em Sorocaba,
passando por Itu.

Salto, onde estou agora, ainda tem sua estação -- devidamente
abandonada. Elias Fausto, aqui juntinho, também. Estive lá na
semana passada e vi fotos da estação. A estação de Itu está bem
mais conservada, mas tornou-se um Centrl Cultural, se não me
engano.

De Santo André também íamos a Santos de trem.
A cidade principal no trajeto de São Paulo para Santos era
Paranapiacaba, pequena cidade, que nunca vi sem neblina,
na beirada da serra, onde o trem começava a ser literalmente
puxado para subir a serra. Emocionante.

Alguém cometeu um crime contra o Brasil, deixando todo o nosso
enorme sistema ferroviário ser sucateado. Precisavam ser
identificados e punidos os criminosos, post mortem,
se necessário.

Por indicação do jornalista José Carlos Daltozo, de Martinópolis,
SP, que tem escrito sobre Lucélia (vide artigo recente
"Lucélia - Terra Natal", neste space), encontrei o site
Estações Ferroviárias.

Lá você pode encontrar fotos da estação ferroviária de sua
cidade, se ela teve uma. E lá encontrei referência ao site
Memória do Trem, que, por sua vez, tem vários links
relacionados.

Uma mina de informação. Ao escrever essas referências me
lembrei de que o meu caro amigo, Tonhão (Antonio Morales),
de Bauru, um dia fez referências a sites sobre ferrovias.
O pai dele foi ferroviário.

Vamos ajudar a preservar a memória do trem...

Em Salto, 2 de agosto de 2006

Crônica originalmente publicada no Blog de Eduardo Chaves


segunda-feira, 21 de setembro de 2009

Trem bom demais - CENAS


por Eduardo Sposito

CENAS


1-Eu com meu avô paterno na Estação da Luz (estava inaugurando um terno branco, calça curta e paletó) em viagem para Santa Cruz das Palmeiras. Devia ter 7 ou 8 anos, 1952 ou 1953. Senti “alguém” bater no meu ombro: volto-me e não vejo ninguém. Como o peso continuasse, descobri a cagada de pomba, que tinha sido certeira no meu paletó branco, carimbado na estréia.

2-Deve ter sido o Reveillon de 60 ou 61: eu na praça da matriz em Santa Cruz das Palmeiras, esperando a meia noite, coçando as nádegas e a parte traseira das coxas: segundo o farmacêutico, uma reação alérgica ao detergente usado para limpar os bancos de madeira dos vagões da 2ª Classe, na viagem de trem que acabara de fazer. Lembro de ter escrito no meu diário: “Entrei o ano novo me coçando...”

3-A melhor viagem, em 65 ou 66, São Paulo/Bauru, viajando de “Pullman”(poltronas individuais reclináveis) com mais três colegas de seminário. Aliás... passamos a viagem na plataforma ou no restaurante.

4-A ÚLTIMA VIAGEM: com saudades disso tudo, agora em dezembro de 80, fiz a última viagem de trem do interior: São José do Rio Preto-São Paulo – trem superlotado, famílias inteiras sentadas em malas no corredor, cheiro de urina e 12 horas de viagem (de carro se fazia em 5) com direito a duas horas parados entre Jundiaí e São Paulo. Um triste adeus.

A música Último trem de Milton Nascimento narra de forma poética esse sentimento de perda que povoa nossas memórias ferroviárias.


Último trem

Milton Nascimento e Fernando Brant

Chora ó meu povo, chora meu maquinista
quem leva os trilhos mata um pouco a sua vida
pois o fim da linha é um pulo no vazio

Apaga a brasa. Vem prá casa meu foguista
esquece a lenha, a caldeira e a fumaça
que a estrada é morta, por ela nada mais passa

Nunca mais, menino, nunca mais meu povo aflito
nunca mais a gente vai ouvir o seu apito
nunca mais a gente vai sentir o seu gemido

Chora ó meu povo, que esse trem não deixa rastro
os trilhos arranca dos lugares onde passa
prá onde vai leva nossa linha

O trem derradeiro é carretel que faz novelo
os trilhos recolhe para nosso desespero
o último trem
faz chorar o povo
leva nossa linha
muda nossa vida
leva a alegria

Veja aqui vídeo com coreografia do Grupo Corpo com o instrumental de Último trem.

quinta-feira, 17 de setembro de 2009

Trem bom demais - Segunda parada


por Eduardo Sposito


Segunda Parada:

Estação Mandaqui:

Anos 50. O acesso à periferia era feito pelos trens de subúrbio, partindo da Estação Areal, com várias linhas. Tive contato com duas delas: a do Horto/Tremembé/Cantareira que passava pelo Mandaqui, onde morei na década de 50: e a de Jaçanã/Gopouva, imortalizada pelo Adoniran, que passava próximo ao seminário onde estudei de 57 a 66.

Acho que me lembro das estações da Linha da Cantareira: Ponte Pequena(?), Santana, Santa Terezinha, Lauzane(?), Mandaqui, Invernada, Quarta Parada, Horto Florestal, Tremembé, Cantareira.

IMAGENS:

- As camisas furadas pela fagulhas que entravam pela janela da “Maria Fumaça”

- O Picoteador furando os bilhetes e o pessoal que não queria pagar fugindo, se escondendo e pulando do trem quando ele reduzia a velocidade na rua Dr.Cesar para entrar na Estação Santana. Em 55 cursava Admissão em Santana e sempre ia de trem, sozinho, aos dez anos... bons tempos!

- “Esses moleques não têm jeito!” – foi a frase que ouvi de uma senhora sentada à janela do trem que estávamos “chocando”, quando eu quase caí embaixo das rodas.

Tinha havido um descarrilamento a 500 metros da estação do Mandaqui e, para a linha continuar funcionando, o trem saía da estação e parava próximo ao acidente, trocando de passageiros com o trem que vinha da Invernada. Aí a molecada se dependurava nos estribos e curtia a viagem de graça.

- Da linha do Jaçanã me lembro que nós íamos jogar futebol num campo em Gopouva-Guarulhos. O campo ficava num buraco, cercado de um barranco por onde o trem passava dando a volta pelo campo. Me lembro que a gente parava o jogo para ver o trem passar lá em cima, tão bonito era.


- “E além disso, mulher...” Ainda tenho nos ouvidos o apito prolongado da última viagem do “Trem das Onze”: veio apitando a viagem toda. Foi muito triste.

quarta-feira, 9 de setembro de 2009

Trem bom demais - Primeira parada

Iniciamos com este, uma série de três posts de autoria de Eduardo Sposito, amigo e colaborador. A série foi batizada de TREM BONDEMAIS e se divide em Primeira parada, Segunda parada e Cenas.

antonio morales

TREMBONDEMAIS

Quem estiver ao redor dos 60 - um pouco mais ou um pouco menos – e não tiver alguma agradável recordação de trens, não só não viveu, como não passou pela vida. (Logicamente deve ter também recordações desagradáveis, graças ao abandono a que os trens foram submetidos até sua lenta e dolorosa extinção na luta contra o Império Automobilístico, numa “via crucis” com muitas estações)

A viagem pela minha infância deve ser feita de trem.

Primeira Parada:

Santa Cruz das Palmeiras:- onde nasci e de onde minha família foi despejada para engrossar a mão-de-obra barata na capital, para o Capital, indo morar num cortiço na rua da Coroa, próximo ao local onde hoje é o Center Norte, na várzea do Tietê.

Meus pais vieram com 2 filhos pequenos, mas os avós maternos ficaram, o que ocasionava viagens anuais de trem pela Linha Paulista.

São estas as imagens que povoam minha infância:

- O acesso à Estação da Luz, até o vagão (de 2ª Classe) onde vinha escrito “Santa Cruz das Palmeiras”: a beleza da estação, a reserva de lugar colocando as malas pela janela, o tamanho das locomotivas, a emoção da partida...

- A viagem: andar pelo trem, o barulho rítmico das rodas sobre os trilhos, as Estações (acho que lembro todas: Jundiaí, Louveira, Vinhedo, Valinhos, Campinas, Sumaré, Americana, Limeira, Cordeirópolis, Araras, Leme, Pirasssununga, Laranja Azeda...Palmeiras), o vendedor de jornais (“Jornal! Revista!...” gritavam todos com o mesmo timbre; vendiam também literatura de cordel, de muito sucesso.), o vendedor ambulante de tubaina e sanduíche de mortadela (não tinha esse negócio de restaurante, que a grana não dava.)...

- A baldeação em Cordeirópolis, onde meu padrinho era funcionário da Paulista: meu pai localizava-o para conversarmos, o que sempre rendia alguns tostões para o afilhado. O medo de que meu pai tivesse ficado na estação: o trem saía e ele entrava em outro vagão para só aparecer depois da partida, assustando as crianças.

- A chegada à cidade, que o trem rodeava antes de chegar à estação, com pés enormes de mangas espada e Bourbon(a minha preferida). Para coroar a ida da estação à casa dos avós era feita de “táxi”: uma charrete enfeitada

- As cartas de minha avó escritas em italiano/português, que no envelope indicava o CEP da época: “Lígnea Paulista)

- A primeira “namorada” acenando na estação enquanto o trem voltava para São Paulo. Isso pelo final dos 40, começo dos 50... no século passado.

sexta-feira, 4 de setembro de 2009

Rumo ao sol. De trem!


por Eli Angela

Final de ano...

A ansiedade tomava conta de nós, crianças. Meu avô (ferroviário...)reunia os netos, fazia planos.Minha avó, com seu casaco lindo, de passeio,aprontava as malas, garantia o estoque de balas e afins. Contávamos as horas, mal conseguíamos dormir, na véspera.

Nem havia amanhecido ainda e nós, saltitantes, íamos todos para a estação de trens, onde a aproximação da locomotiva fazia o coração bater mais forte de emoção .
Era imensa, enorme,meio assustadora em sua imponência.

Tomávamos nossos lugares nos bancos(eu adorava a "janelinha"- e quem não?) , começava o movimento dos vagões , tudo ficando para trás...paisagens novas, vento no rosto , sorrisos, brincadeiras - rumo ao sol, ao céu, ao mar ...de Santos!

terça-feira, 1 de setembro de 2009

Trem das cores

Trem das cores, de Caetano Veloso. Uma linda canção que evoca as paisagens e cores vistas a partir da janela do trem e evocando sentimentos. Segue a letra da canção. Vejam o vídeo com a música na voz de Caetano e belas imagens. Uma singela e poética homenagem às viagens de trem de nossa memória! Clique aqui para ver o vídeo.

antonio morales

Trem Das Cores

Caetano Veloso

Composição: Caetano Veloso

A franja na encosta
Cor de laranja
Capim rosa chá
O mel desses olhos luz
Mel de cor ímpar
O ouro ainda não bem verde da serra
A prata do trem
A lua e a estrela
Anel de turquesa
Os átomos todos dançam
Madruga
Reluz neblina
Crianças cor de romã
Entram no vagão
O oliva da nuvem chumbo
Ficando
Pra trás da manhã
E a seda azul do papel
Que envolve a maçã
As casas tão verde e rosa
Que vão passando ao nos ver passar
Os dois lados da janela
E aquela num tom de azul
Quase inexistente, azul que não há
Azul que é pura memória de algum lugar
Teu cabelo preto
Explícito objeto
Castanhos lábios
Ou pra ser exato
Lábios cor de açaí
E aqui, trem das cores
Sábios projetos:
Tocar na central
E o céu de um azul
Celeste celestial